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Rafael Reis

Paraense cruzou o mundo, comeu morcego e esperou 37 anos por 1ª convocação

Rafael Reis

08/09/2019 04h00

Alberto Gonçalves da Costa nasceu no Pará. Jogou no Remo, na Tuna Luso e no Bragantino. Atravessou o planeta em busca de melhores oportunidades profissionais. Comeu carne de morcego e de cachorro. Teve de viajar um dia direito para disputar uma partida de futebol. E precisou esperar longos 37 anos para realizar o sonho de infância: defender uma seleção.

Convocado desde outubro de 2018 pela Indonésia, o centroavante é hoje a principal referência ofensiva da equipe que disputa as eliminatórias asiáticas da Copa do Mundo-2022 e marcou dez vezes nas primeiras nove partidas que disputou pelo país.

Crédito: Acervo pessoal

Mesmo assim, enfrenta preconceito diário… não por ser um jogador naturalizado que está tirando espaço de um atleta local na seleção, mas sim por ter 38 anos, idade em que boa parte dos atletas já estão aposentados.

"Direto pego jogadores falando em campo que não podem perder para um velho como eu. Minha primeira convocação foi bastante polêmica. Muita gente criticou. Mas eu me cuido bastante e corro mais que muitos novinhos", afirma Beto Gonçalves, como é conhecido.

Mas a história de como um paraense de Belém se tornou o maior astro da seleção de um país cujo território está a 17 mil quilômetros de distância de sua cidade-natal é bem mais completa e recheada de episódios incomuns.

Beto chamou a atenção de um empresário com conexões no futebol asiático quando ajudou o Remo a conquistar a Série C do Campeonato Brasileiro, lá em 2005.

"O que eu sabia da Indonésia na época era o tsunami, que havia acontecido no ano anterior [e matado cerca de 230 mil pessoas]. Mas, no fim de 2006, fiquei sem clube e resolvi arriscar. Eu não tinha outra opção. Fui para ficar só um ano, mas estou até hoje", relembra.

Nesses quase 13 anos, o atacante já defendeu oito clubes diferentes. Casado com uma indonésia, Beto rapidamente se inseriu na cultura local e viveu experiências que causam espanto aos olhos ocidentais.

"Já comi carne de cachorro, mas fui enganado, porque meus amigos não disseram do que era e ela estava bem temperada. Outra vez, em uma ilha mais afastada, saímos para pescar de barco e encontramos uma árvore imensa. Meus companheiros pegaram uma cartucheira e derrubaram uns cinco morcegos. Assamos e comemos os bichos."

Crédito: Acervo pessoal

As viagens para os jogos do Campeonato Indonésio são outro tipo de aventura que Beto costuma viver. Como o país é um arquipélago espalhado pelos Oceanos Índico e Pacífico, a comunicação entre as ilhas está longe de ser das melhores.

"Pessoal acha que é mentira, mas já fiquei 26 horas viajando para disputar uma partida. Fomos de avião, mas ele parava de ilha em ilha para embarque e desembarque de passageiros", relembra.

A chance na seleção da Indonésia até poderia ter vindo mais cedo. Mas, quando estava completando os cinco anos de residência no país para obter a naturalização, Beto machucou o Tendão de Aquiles e precisou voltar ao Brasil. A nova oportunidade chegou bem mais tarde, só no ano passado, quando o atacante já era veterano e havia desistido de ser convocado.

"O Sriwijaya [clube que defendeu de 2016 a 2018] queria montar um time forte e pediu para que eu me naturalizasse para abrir uma nova vaga de estrangeiro. Aceitei porque percebi que era uma possibilidade de prolongar a carreira. Mas aí a seleção precisou de um centroavante e acabei tendo a minha chance", completa o paraense de 38 anos.


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Sobre o Autor

Jornalista formado pela Universidade Estadual de Londrina e mestre em comunicação pela Fundação Cásper Líbero, foi repórter da Folha de S. Paulo por nove anos e mantém um blog sobre futebol internacional no UOL desde 2015.

Sobre o Blog

Este espaço conta as histórias dos jogadores que fazem do futebol uma paixão mundial. Não só dos grandes astros, mas também dos operários normalmente desconhecidos pelo público.