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Rafael Reis

Antes da fama, Jorge Jesus foi "rei do acesso" e quebrou por culpa de banco

Rafael Reis

20/11/2019 04h00

Jorge Jesus, 65 anos, está a um jogo de conquistar o título mais importante de sua carreira como treinador e de poder colocar a medalha da Libertadores na mesma prateleira onde estão os prêmios de tricampeão de Portugal e das dez copas nacionais que já levantou.

Mas antes de se transformar em um colecionador de taças e colocar seu nome na lista dos técnicos portugueses mais importantes da atualidade, o comandante do Flamengo precisou superar muitos obstáculos.

Crédito: Reprodução

Entre 1989, quando iniciou na carreira, e 2009, ano em que chegou ao Benfica e despontou pra o estrelato, Jesus teve de batalhar em divisões inferiores, ficou conhecido como "rei do acesso" e até viu todas suas economias desaparecem de uma hora para outra.

Ex-jogador de pouco brilho que rodou por inúmeros clubes pequenos, o português estreou no banco de reservas dirigindo o Amora FC, que na época disputava o equivalente à quarta divisão nacional.

Foi lá que ele obteve seu dois primeiros acessos. Em 1990, subiu para a terceirona. Dois anos depois, venceu a competição e alcançou a promoção para a Liga de Honra, a Série B lusitana. No Felgueiras, clube que o contratou em 1993, foi além. Em sua segunda temporada, obteve a inédita vaga para a primeira divisão.

Jesus ainda protagonizou mais uma promoção para consagrar o apelido de "Rei do Acesso". Em 2000/01, ele comandou o Vitória de Setúbal, que terminou a Segunda Liga na terceira posição e com a vaga na elite em mãos.

"Ele chegou com o campeonato já em andamento, depois de umas seis rodadas. No começo, foi um choque. Ele cobrava demais, e alguns atletas não entendiam e levavam para o lado pessoal. Mas quem percebia que isso era para o bem da equipe, logo via que ele era alguém muito agradável", recorda o ex-zagueiro brasileiro Gélson Baresi, que também passou por Flamengo, Cruzeiro e Coritiba, entre outros.

"Vejo muitas semelhanças entre o nosso time e o Flamengo atual. Mesmo naquela época e estando na segunda divisão, já jogávamos com defesa alta e tínhamos um zagueiro canhoto alto, algo de que o Jesus não abre mão. Ele também já ressaltava que os jogadores são todos iguais do pescoço para baixo e que o que faz a diferença é a cabeça", completa.

Outro ex-comandado do português que fica com uma sensação de déjà-vu quando vê o finalista da Libertadores em campo é o meio-campista Márcio Mossoró. Atualmente no Göztepe, da Turquia, ele foi dirigido por Jesus no Braga de 2008/09, time que transformou a vida do treinador.

"Graças a Deus tive a honra de trabalhar com Jorge Jesus, um treinador muito ambicioso e que vive futebol o dia todo. Quando cheguei em Portugal, ele era um técnico que todos os conheciam o potencial, mas que ainda não tinha tanto nome. Foi no Braga que ele deu seu o salto para se tornar conhecido e depois trabalhar no Benfica e no Sporting."

O trabalho do treinador no clube foi de apenas um ano, mas que durou uma eternidade. Dentro de campo, a equipe foi quinta colocada no Português e chegou até às oitavas de final da Copa da Uefa (hoje Liga Europa).

Foi nessa época também que Jesus viu sua segurança financeira ir para o espaço, com a quebra do Banco Privado Português, que fez desaparecer cerca de 1 milhão de euros (mais de R$ 4,6 milhões) que o técnico havia economizado ao longo da carreira –parte do dinheiro foi recuperado em 2014, quando ele já não precisava mais tanto da grana.

Crédito: Reuters

Ainda no Braga, ele fez questão de revelar aos jogadores qual era seu maior sonho no futebol.

"Quando íamos começar a disputa da Taça de Portugal, ele tinha acabado de perder o pai. Então, teve um dia que nos disse que sonhava conquistar esse campeonato para homenageá-lo, já que quando criança costumava ir com o pai ao estádio para assistir das arquibancadas a final da Taça de Portugal", conta Mossoró.

O sonho de Jesus não foi realizado no Braga, que foi eliminado na quarta fase do torneio naquele ano. Foi só em 2013/14, sua penúltima temporada pelo Benfica, que o já consagrado treinador alcançou a meta de sua carreira e pode celebrar seu pai, Virgolino António de Jesus, que também foi jogador de futebol.

Flamengo e River Plate decidem no próximo sábado, em Lima (Peru), qual é o melhor time da América do Sul neste ano. Os brasileiros, campeões em 1981, buscam o segundo título de Libertadores de sua história. A equipe argentina, vencedora em 1986, 1996, 2015 e 2018, quer o penta.


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Sobre o Autor

Jornalista formado pela Universidade Estadual de Londrina e mestre em comunicação pela Fundação Cásper Líbero, foi repórter da Folha de S. Paulo por nove anos e mantém um blog sobre futebol internacional no UOL desde 2015.

Sobre o Blog

Este espaço conta as histórias dos jogadores que fazem do futebol uma paixão mundial. Não só dos grandes astros, mas também dos operários normalmente desconhecidos pelo público.