O futebol precisa destruir o racismo antes que o racismo destrua o futebol
Rafael Reis
06/04/2019 04h00
Na última terça-feira, o italiano de origem marfinense Moise Kean ouviu imitações de macaco e insultos racistas após marcar um gol contra o Cagliari. Para piorar, o zagueiro Leonardo Bonucci, seu companheiro na Juventus, apontou o próprio parceiro como 50% responsável pelo incidente por supostamente ter provocado a torcida adversária.
Dois dias depois, o lateral inglês Danny Rose, do Tottenham, deu uma forte entrevista em que disse esperar ansiosamente o fim de sua carreira para poder "dar as costas" ao futebol, já que não aguenta mais os episódios de preconceito racial que fazem parte do seu cotidiano.
As duas declarações, dadas na mesma semana, mostram que o racismo continua sendo um mal enraizado nas raízes do esporte mais popular do planeta. E pior: que o futebol ainda está perdendo de lavada a guerra contra o preconceito.
O racismo é inaceitável em qualquer ambiente. Mas o fenômeno se torna ainda mais inexplicável quando falamos de uma modalidade que teve boa parte da sua história construída por negros.
É inegável que o futebol não seria o que é hoje se não fossem Leônidas da Silva, Pelé, Didi, Garrincha, Ronaldinho, Romário, o português Eusébio, o liberiano George Weah, o camaronês Samuel Eto'o…
A própria França, atual campeã mundial de seleções, ganhou o apelido de "negros maravilhosos" pelo narrador Luís Roberto (Globo) e tem como protagonistas Paul Pogba e Kylian Mbappé, ambos de raízes africanas.
Mas, além do respeito ao seu próprio DNA histórico e da ética de aceitação de todas as etnias, o futebol precisa deixar de ser um ambiente de proliferação do racismo para garantir a sua própria sobrevivência.
Em sua sociedade de posições cada vez mais firmes e radicalizadas, já há torcedores e possíveis patrocinadores que não querem se envolver com a modalidade por verem nela um antro de preconceito não só racial, mas também de gênero e orientação sexual.
Esse número pode até parecer incipiente hoje, mas certamente irá aumentar nos próximos anos. Afinal, a luta pela igualdade é uma bola de neve, que só tem crescido com o passar do tempo.
É claro que sempre haverá os racistas que incentivam uma modalidade cuja torcida maltrate os negros. E também continuarão existindo os que fecham os olhos a essas atrocidades em prol da diversão que o esporte pode proporcionar.
Mas se o futebol quer continuar sendo universal, ele não pode ser ao luxo de dialogar apenas com esses públicos… principalmente em uma questão em que é muito claro quem está certo e quem está errado.
Para sepultar o racismo, a modalidade precisa tratá-lo como um problema de primeira urgência. Só a exibição de mensagens a favor da pluralidade racial não basta, é necessário endurecer as penas contra quem pratica o preconceito.
E aí, estou falando de duras punições esportivas aos times cujos torcedores praticam atos racistas (perda de pontos e até eliminações de campeonatos) e também suspensões pesadas a dirigentes, jogadores, técnicos e outras pessoas do mundo da bola que caírem na prática desse crime.
Na prática, o futebol precisa agir rápido para destruir o racismo para não correr o risco de ser aniquilado por ele.
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Sobre o Autor
Jornalista formado pela Universidade Estadual de Londrina e mestre em comunicação pela Fundação Cásper Líbero, foi repórter da Folha de S. Paulo por nove anos e mantém um blog sobre futebol internacional no UOL desde 2015.
Sobre o Blog
Este espaço conta as histórias dos jogadores que fazem do futebol uma paixão mundial. Não só dos grandes astros, mas também dos operários normalmente desconhecidos pelo público.