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Rafael Reis

Comparado a Maradona em 94, saudita ficou preso e foi açoitado em público

Rafael Reis

06/06/2018 04h30

Uma arrancada que começou na intermediária defensiva, atravessou o campo, com direito a quatro adversários driblados e um toque na saída de Michel Preud'Homme, um dos melhores do planeta na época.

O gol marcado Saeed Al-Owairan na vitória por 1 a 0 sobre a Bélgica, pela última rodada da fase de grupos da Copa do Mundo-1994, foi eleito o mais bonito da competição. E transformou a vida do meia-atacante da Arábia Saudita. Para o bem e para o mal.

Graças a essa obra de arte, a seleção asiática conseguiu avançar às oitavas de final logo em sua primeira participação no Mundial.

Além disso, o gol rendeu a Al-Owairan o apelido de "Maradona árabe", uma referência clara ao tento histórico anotado pelo craque argentino contra a Inglaterra, oito anos antes, na Copa-1986.

Do dia para a noite, o camisa 10 da Arábia Saudita se transformou em uma celebridade do mundo da bola.

Al-Owairan virou garoto-propaganda para o Oriente Médio de várias marcas importantes, como Coca-Cola e Ford, e uma espécie de embaixador do país no exterior. Também ganhou muito dinheiro e só não foi jogar na Europa porque as leis sauditas da época não permitiam a saída para o exterior.

Mas o sucesso dentro de campo e no mercado publicitário foi também o início de sua derrocada.

Em 1996, dois anos após o lance que o levou ao estrelado, Al-Owairan fugiu da concentração do Al-Shabab, clube saudita que defendeu durante toda a carreira, durante uma viagem ao Cairo, capital do Egito.

O astro foi flagrado em uma boate bebendo ao lado de garotas de programa russas, cometendo dois pecados graves de acordo com o Islã. Para piorar, tudo isso aconteceu durante o Ramadã, o mês sagrado dos muçulmanos, quando os fiéis devem respeitar jejum do nascer ao pôr do sol e se abster de práticas sexuais.

Mesmo com toda a fama de Al-Owairan, o governo saudita foi implacável com ele. Para servir de exemplo ao resto da população, o jogador foi proibido de jogar futebol por oito meses, ficou preso durante meio ano e acabou açoitado em praça pública.

Após cumprir suas penas, meia-atacante retornou ao esporte no ano seguinte, participou da Copa de 1998 e abandonou os gramados depois de alguns meses. Ele ainda é um dos dez maiores goleadores da história da seleção saudita, com 24 bolas na rede em 75 partidas.

"O gol contra a Bélgica foi uma faca de dois gumes para mim. De alguma forma, foi ótimo; de outra, foi horrível, porque me colocou nos holofotes, e todo mundo passou a se concentrar em mim", disse, em entrevista ao "New York Times", em 1998.

De volta às Copas do Mundo depois da ausência nas duas últimas edições, a Arábia Saudita faz o jogo de abertura da competição, contra a Rússia, no dia 14, em Moscou. Uruguai e Egito são as outras seleções do Grupo A.


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Sobre o Autor

Jornalista formado pela Universidade Estadual de Londrina e mestre em comunicação pela Fundação Cásper Líbero, foi repórter da Folha de S. Paulo por nove anos e mantém um blog sobre futebol internacional no UOL desde 2015.

Sobre o Blog

Este espaço conta as histórias dos jogadores que fazem do futebol uma paixão mundial. Não só dos grandes astros, mas também dos operários normalmente desconhecidos pelo público.