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Rafael Reis

Afinal, por que Gabigol deu tão errado no futebol europeu?

Rafael Reis

08/01/2018 04h00

Trezentos e quarenta sete minutos distribuídos por 15 partidas, dois gols, nenhuma assistência, dois cartões amarelos e passagens sem nenhum brilho por Inter de Milão e Benfica.

É esse o resumo do último um ano e meio de carreira de Gabigol. Um resumo tão cheio de marcas negativas que deve encurtar a passagem do centroavante de 21 anos pelo futebol europeu.

A Inter de Milão, clube que tem contrato com o brasileiro até junho de 2021, não pretende utilizá-lo na segunda metade da temporada 2017/18. O Benfica, para onde ele está emprestado, também não faz questão nenhuma de sua permanência.

A solução para "questão Gabigol" deve ser um novo empréstimo, mas para o Brasil, onde ele ainda tem mercado. O Santos, time que o revelou, e o São Paulo são seus destinos mais prováveis.

Mas, afinal, como é possível que um jogador que parecia destinado a construir uma bonita carreira na seleção tenha dado tão errado na Europa? Quais os motivos desse retumbante fracasso?

Uma resposta simples na linha de "Gabigol não joga nada e só se destacava por aqui devido ao baixo nível técnico do futebol brasileiro", tão comum nas discussões sobre o atacante nas redes sociais, não resolve a questão.

Isso porque nenhum jogador de tão baixo nível técnico conseguiria ser promovido ao time profissional do Santos com 16 anos, virar titular antes de atingir a maioridade, ser artilheiro de duas edições da Copa do Brasil, ganhar a medalha olímpica de ouro, receber oportunidades na seleção principal, enganar olheiros de boa parte dos principais clubes do mundo e ser negociado com a Inter de Milão por 20 milhões de euros (R$ 78 milhões).

Vale lembrar que, um ano e meio atrás, a resposta para uma pergunta normal na época, "Quem é melhor: Gabigol ou Gabriel Jesus?", não era nada óbvia. Muita gente apostava mais no santista do que na cria do Palmeiras, hoje o camisa 9 da seleção brasileira.

Ou seja, o motivo do fiasco europeu protagonizado por Gabigol não é de ordem técnicas, ou, pelo menos, não é apenas de ordem técnica. Ainda que não seja um craque de primeiro escalão do futebol mundial, o brasileiro tem bola para fazer parte do elenco da Inter (ou ao menos do Benfica).

O ponto que realmente derrubou o atacante no Velho Continente não é a sua capacidade de jogar futebol.

O que mais chama a atenção na passagem de Gabigol pela Europa é a escassez de oportunidades que recebeu. Contando apenas o período útil (ou seja, excluindo as férias), o atacante jogou em média 23 minutos por mês.

Esses números, dignos que garotos que estão na transição das categorias de base e a equipe profissional, refletem algo que nós, os jornalistas, não temos como acompanhar bem, os treinos. Gabigol não jogava porque não mostrava nada nos treinamentos que convencesse seus treinadores (e foram quatro em um ano e meio) a apostar nele.

Agora, por que o atacante não treinava bem sendo que capacidade técnica não é o maior dos problemas para ele? É aí que entra uma das características que os torcedores mais costumam criticar no ex-santista: a displicência.

Gabigol não é daqueles jogadores que têm sangue nos olhos. Tratado como craque no Santos desde o início da adolescência, acostumou-se a ser visto como diferenciado. O efeito colateral é de que perdeu competitividade, aquele instinto de lutar para sobreviver.

E isso faz falta em um lugar onde você chega sendo apenas "mais um" e precisa de humildade para conquistar espaço. O brasileiro desembarcou na Inter achando que sua titularidade era uma mera questão de tempo. Só que o tempo foi passando, as chances não apareceram e ele não mostrou capacidade de lutar para reverter essa situação. Por isso, foi para o Benfica.

A situação se repetiu no clube português. E é por isso que Gabigol deve desembarcar em breve no futebol brasileiro, onde ainda goza do respeito conquistado durante a passagem pelo Santos.

O atacante tem só 21 anos e uma carreira inteira pela frente para voltar no futuro ao futebol europeu, fazer sucesso por lá e reconquistar um lugar na seleção. Mas, para que tudo isso aconteça, ele precisa mudar sua personalidade.

Para ser o jogador de futebol que julga ser, Gabigol precisa reaprender a lutar.


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Sobre o Autor

Jornalista formado pela Universidade Estadual de Londrina e mestre em comunicação pela Fundação Cásper Líbero, foi repórter da Folha de S. Paulo por nove anos e mantém um blog sobre futebol internacional no UOL desde 2015.

Sobre o Blog

Este espaço conta as histórias dos jogadores que fazem do futebol uma paixão mundial. Não só dos grandes astros, mas também dos operários normalmente desconhecidos pelo público.