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Rafael Reis

Bombas e lei do silêncio: conheça o brasileiro que jogou na Síria em guerra

Rafael Reis

29/12/2015 07h35

"A gente ouvia bombas estourando, via caças sobrevoando por cima da nossas cabeças e policiais andando com metralhadoras."

O volante brasileiro Gilson Tussi viu de perto o início da guerra civil na Síria que espalhou milhões de refugiados pela Europa, criou uma crise humanitária nas fronteiras do Velho Continente e contribuiu para o fortalecimento do grupo terrorista Estado Islâmico.

Entre dezembro de 2011 e o fim de 2013, o jogador paranaense atuou pelo Al Shorta, time controlado pela polícia síria.

E, mesmo morando na capital Damasco, longe do epicentro dos conflitos entre as forças do presidente Bashar al-Assad e grupos rebeldes que tentam demovê-lo do cargo, viveu a aflição de estar em um país em guerra.

Gilson

"Lógico que era estranho, mas não acontecia nada perto de mim. Só que minha esposa estava no Brasil e via tudo pela TV. Mas só quem está lá dentro sabia o que estava acontecendo", contou o volante.

"Um dia, ela disse que tinha ouvido que o Obama [presidente dos EUA] ia invadir e bombardear a Síria. Eu tive que explicar para ela que não era bem assim para acalmá-la um pouco", lembrou.

Além da pressão familiar para que voltasse ao Brasil, Gilson sentiu o agravamento da guerra civil ir, aos poucos, dificultando sua permanência na Síria.

No primeiro campeonato nacional que disputou, vencido pelo Al Shorta, cada clube podia atuar em seu próprio estádio. Já na segunda edição, só Damasco era um local seguro e todas as partidas foram realizadas na capital.

Para completar, o Campeonato Sírio proibiu a escalação de jogadores estrangeiros para não prejudicar os clubes que haviam tido as finanças prejudicadas pela guerra. Com isso, Gilson não teve seu contrato renovado e voltou ao Brasil.

Com contrato assinado para disputar o Campeonato Piauiense pelo River, o volante ainda mantém contato com antigos companheiros de time. Só que a guerra e as indefinições políticas da Síria são assuntos proibidos.

"Converso com alguns jogadores, mas eles não falam nada porque lá tudo é rastreado. Se começo a falar sobre isso, eles já pedem rápido para mudar de assunto."

E se surgisse uma proposta para voltar a jogar na Síria, o que Gilson faria? Nem ele sabe.

"Tenho medo. Pra voltar, tenho medo. Hoje, tem essa situação do Estado Islâmico, que não era muito forte na minha época. Mas tem a questão financeira, eles pagam muito bem. Para falar a verdade, não sei."

Sobre o Autor

Jornalista formado pela Universidade Estadual de Londrina e mestre em comunicação pela Fundação Cásper Líbero, foi repórter da Folha de S. Paulo por nove anos e mantém um blog sobre futebol internacional no UOL desde 2015.

Sobre o Blog

Este espaço conta as histórias dos jogadores que fazem do futebol uma paixão mundial. Não só dos grandes astros, mas também dos operários normalmente desconhecidos pelo público.